Imagem extraída da Internet – Fardamento protector
#70 – LIDANDO COM O INIMIGO!
Mas alguém ousa duvidar que somos profissão de risco? É que nem se atreva!!!
Podia ignorar o Outro que precisa mim, no aqui e agora, mais do que nunca. Podia até, enterrar a cabeça na areia e enclausurar-me em casa… a atitude seguramente mais confortável e segura para quem a pode ter. Mas não!…Nesta temível guerra, em que impera a dúvida, a insegurança, o medo, e quiçá para alguns, até o pânico, o meu dever é estar nas trincheiras, na linha da frente de combate, dando o melhor de mim… E esperar confiante, que o inimigo vil não se aproprie do meu corpo, nem da minha alma.
Quanto aos meus, que se encontram em privação de mim, apenas apelo à vossa compreensão, e paciência. Vamos comunicando por outras vias.
Até lá, fiquem em casa; cumpram à risca as directivas da DGS. Porque a besta há-de ceder. Há-de!
“Ando de um lado para o outro dentro de mim”! – Assim o escreveu Clarice Lispector. E é exactamente assim como me sinto ultimamente: numa luta constante, para manter por perto aquilo que me faz bem e feliz.
Sou uma mulher apaixonada. Apaixonada pela vida, pela minha família, pelos meus melhores amigos, pelo meu trabalho, por música, por livros, por algumas figuras públicas cujas características valorizo, por lugares que pacientemente me esperam… pelos meus colos, presentes ou ausentes.
Todas estas paixões vivem comigo todos os dias, e vão ficando; não sucumbem ao tempo, nem a nenhuma mudança, porque já faziam parte de mim. Correm-me no sangue.
Bem mais complicado, é apaixonar-me por alguém, e, manter acesa a chama da paixão. Se bem que, pode acontecer.
Aliás, a paixão apanha-nos a todos na curva; às vezes, subtilmente; outras, de forma avassaladora. De qualquer forma, quando acontece, estou em crer que todos nós cultivamos ao máximo esse sentir que nos faz ficar mais parvos, mais ridículos, mais desfasados da realidade; mas também mais bravios, mais corajosos, mais altos, mais felizes… ainda que, o preço seja muitas vezes, perder a cabeça, a razão, e, não raramente, partir o coração.
E é assim que me sinto: com o coração partido, ao ver-te partir aos poucos, de dentro de mim.
Uma parte de mim suplica que fiques, que te demores em mim; mas a outra anseia que te vás, pelas nossas diferenças, afinal, irreconciliáveis, em realidades cada vez mais intangíveis.
Que pena, meu amor. O nosso tempo urge. Como se de uma sentença de morte se tratasse.
Por isso, ando às voltas dentro de mim!… E tu, tampouco desconfias. Quiçá o suspeites, mas não ouses sequer questionar, com receio de precipitares o nosso adeus?
Caminho nesta incerteza, com a certeza – cada vez mais consistente -, de que seremos mais felizes se seguirmos por trilhos diferentes. Cada um no seu; e, na bagagem, doces lembranças despidas de qualquer ponta de rancor.
Dou comigo a pensar se devemos dizer sempre a verdade numa relação amorosa, ou se será preferível calar o que supostamente não se deve dizer, para não fazer mossa; calar o que sentimos e que nos faz pruridos, por pudor, por educação, ou medo de ferir susceptibilidades, ou, inclusive, medo de perder quem amamos. (?)
I’m confused. So what?
Sabes aquelas cenas em que ele, inconsciente e subtilmente, começa a fazer descrições e comparações com a(s) ex? Uma pessoa fica sem paciência para o ouvir, certo? Fica desconfortável; começa a irritar-se, a sentir uma pontinha de ciúme; despoleta a insegurança, enfim… a relação, que devia ser a dois, passa a correr o risco de ir ao fundo, por excesso de passageiros.
Caramba! Se te incomoda que ele fale das que constam no livro da vida dele, e que já passaram à história, diz-lhe isso mesmo, e, pronto!
É muito mais fácil usar a verdade no presente e no futuro. Esquece lá o tempo passado ou o modo condicional! E, então, o uso deste último é realmente uma tragédia para qualquer relação afectiva. É quando ele usa e abusa dos “ses”, do tipo:
“- Ah! Se fosses um pouco mais magra!… Ou: “- Se estivesses mais perto daqui!… Ou ainda: “- Se fizesses assim, ou, assado, eu faria cozido!…”
Fica-se com ganas de responder ao personagem uma daquelas respostas xeque-mate, do género:
“- Ai sim? Hasta la vista! Ah!… E não ouses voltar. Ok?”
A verdade é que o modo condicional é [quase] sempre – ou não! -, uma requintada forma de desculpa esfarrapada, para se justificar algo que não se quer, ou não se deseja de todo que aconteça.
Dito mais simples, se ele te confrontar concomitantemente com conversas onde predominam os “ses” e os “talvez”, minha cara(!), mete uma coisa na tua cabecinha:
ELE NÃO TE AMA! Tu não és a prioridade dele. Em suma, não és A TAL. Percebeste?
Depois de inculcares isto, só te restam duas hipóteses: ou permites-te viver infeliz numa relação que está a morrer aos poucos, e, por isso mesmo, a dar cabo de ti; ou, ousas matá-la de vez – a relação! -, friamente, sem quaisquer escrúpulos, sem olhar para trás,… permitindo-te sorrir de novo à vida e ao amor, até então, desacreditado.
Pois é!… Há decisões difíceis de tomar. Por qual destas optarias?
Sinto que te estou a perder aos poucos; lenta e suavemente. Mas não há muito mais que eu possa fazer; já que os nossos corações deixaram de bater em uníssono.
Não me passa pela cabeça viver um “meio-amor”; pechinchar por um sentimento que não é mais autêntico. No way!
Por isso, decidi começar a arrumar a minha bagagem. Nela levo malas repletas de sonhos; alguns inacabados. Caixas com sorrisos e risos sinceros. Pacotes de tristezas e lágrimas choradas. Mochilas de tombos que dei, e, as nódoas negras que os recordam. Sacos com saudades. Caixotes com as vitórias conseguidas e com o suor, nelas despendido.
Nem penses que tenciono levar-te na minha bagagem. Ficas muito bem aí onde estás, na tua zona de conforto, à espera de saberes o que queres.
Desculpa-me se te magoam estas minhas palavras, mas a inquietude da minha alma perturba-me; pede-me mais, muito mais do que aquilo que me tens dado.
Acomodaste-te no vazio da indiferença, e, esqueceste que tinhas que continuar a dar de ti. Sabias?
E agora?
E agora, espero sinceramente que [te] encontres, onde diabo deixaste o teu coração (?).
Quando deres com ele, se ainda tiver inscrito o meu nome, sacode-lhe a poeira e vem mesmo assim! Segura-o com ambas as mãos e trá-lo com carinho.
Pode ser que consigas ter-me de volta. Pode ser; quiçá?… Mas nada posso prometer.
Não se reviam propositadamente há uma catrefada de luas. Também não era suposto reverem-se nesta fase de luto do namoro que mantiveram durante a adolescência e início da juventude de ambos. Afinal de contas, tinham sido o primeiro grande amor, um do outro. – God! What a difficult situation!…
Tinham combinado ficar amigos, e, só isso mesmo; pelo menos por ora. O tempo encarregar-se-ia do resto: tratar as maleitas; arrumar a cabeça, o coração; dissipar dúvidas; [re]conquistar novas escolhas, novas oportunidades… viver!
Eram tão jovens, inexperientes, sonhadores; tão cheios de vida e projectos futuros não possíveis de concretizar num horizonte próximo. Eram!…
E, amavam-se; cada um na sua, e, à sua maneira, mas amavam-se, apesar das borboletas na barriga se terem dissipado durante o ano transacto.
O que teria acontecido para dizimar um amor tão bonito?
Nem eles próprios sabiam. Sabiam apenas que não se contentavam com os “vai-se andando”, “quando mal, nunca pior”, ou com os “é a vida!”. Não aceitavam dias mornos num futuro trabalho chato, que nada lhes dizia, ou, noites gélidas numa companhia amena cujo colo é quente e confortável, mas que já não retém o coração… já não o derrete como outrora.
Ambos mantinham a mesma linha de pensamento, ou pelo menos, pareciam manter – para os amigos e os mais chegados, claro! – . E será que realmente conseguiam manter? As aparências iludem. Sabe Deus o que iria nos recônditos mais íntimos de cada um!…
Não se vai ali à curva esquecer o primeiro [grande] amor, e volta-se curado com um sorriso de orelha a orelha.
O amor acontece; mas também desaparece, mesmo sem nenhum motivo especial. Por isso, mais do que esmiuçar os porquês do mistério do enamoramento ou do desapego – que é uma conversa equivalente a discutir-se o sexo dos anjos -, é importante perceber muito bem se o outro nos ama da mesma forma, com a mesma intensidade, e, se está disposto a fazer por nós, o que nos dispomos a fazer por ele.
Porquê? Porque um amor a sério aguenta o que quer que seja: desentendimentos, afastamentos, bons e maus momentos, braços-de-ferro, disputas. E se for mesmo a sério, dura, dura e dura; tal como um bom lenço de seda: jamais perde o toque, o conforto, a suavidade, o charme, o sentido… desde que bem tratado evidentemente.
Seria o amor deles, um amor a sério? Poderia ter sido, até conhecerem o lado do avesso de cada um.
Não conhecemos o outro até ao momento em que o vemos e sentimos por inteiro, e depois, de repente, não mais que de repente, como diz Vinicius De Moraes no seu “Soneto De Separação”, tudo muda, como que, por magia. Ainda assim, continuamos a amar, para sobreviver. Porque sem ele – o amor -, nada faria sentido.
A partir daquele dia em que se reviram pela última vez, tudo mudaria para ambos; nada voltaria a ser o mesmo – nem eles próprios!
Uma espécie de tsunami fez despoletar emoções e sensações há muito recalcadas. Soou um “amo-te/odeio-te!” desesperado, um “dei-te o melhor de mim…não vás!”; um “sem ti não vivo, vegeto!” e um “mereces melhor do que eu… quero que sejas feliz!”; escoaram lágrimas de sangue para o rio. E o abismo espreitava de insolente – ria esfregando as mãos; almejava a perdição dos querubins.
Afinal, a ferida em fase cicatricial ainda doía… e muito! Ainda assim, nada ficou por dizer, porque naquela linda noite de lua cheia, a confrontação tinha vindo de mãos dadas com as certezas. Finalmente iriam acabar os mas, os ses e os talvez. Havia que seguir em frente, e, de cabeça levantada… para bem de ambos!
Poderiam continuar amigos? – questionaram-se. Claro que sim, mas por ora, em silêncio. Urgia cicatrizar a ferida primeiramente.
– Cuida de TI! – Foram as últimas palavras que trocaram.
E partiram, com o coração aos pedaços. Cada um no seu trilho, mas agora bem mais leves, sem pesos na bagagem.